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Axé para você também

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Por Nathália Peres e Joyce Ribeiro.

“Aqui é minha vida! O samba, a escola é minha vida. Aqui eu me realizo. Eu chego aqui e sou bem recebida, recebo carinho e amor. Eu saio daqui de alma lavada, isso é uma terapia. ” Com a felicidade transbordando em seu sorriso, a baiana Nilza Santos de Oliveira Silva, conta com um brilho em seu olhar a alegria de participar do carnaval de São Paulo. Sem deixar que seus problemas pessoais interfiram em seu samba no pé, Nilza menciona que há dois anos, ela não conseguia andar por conta da amputação dos dedos do pé, o que não a impediu de rodar na ala das baianas com muito amor e muito carinho. Durante seu relato, com vestimenta vermelha e branca com um lenço vermelho enrolado na cabeça, a senhora não parava um minuto com o som da bateria da Leandro de Itaquera de fundo, contando que não tem

como ficar parada com o som, que aquilo lhe realiza. Apesar de o carnaval ser uma festa pagã, ele se resume em uma grande folia, havendo uma grande mistura entre a fé e a religião. Escolas de samba muitas vezes homenageiam em seu desfile, orixás ou santos. Em 2016 ao menos sete escolas do Grupo Especial tiveram ícones religiosos em sua composição.

 A Escola de samba Unidos de Vila Maria, que teve ajuda da igreja católica para a construção do samba enredo do carnaval de 2017, homenageou Nossa Senhora Aparecida, considerada a padroeira do Brasil, exigindo apenas que os figurinos fossem mais comportados e aquelas regras impostas pela igreja, são deixadas de lado e no final, tudo vira festa.

Sendo uma tradição, ao inicio de cada desfile nas escolas de samba no

sambódromo, o Afoxé, que possui elementos do candomblé, desfila abençoando a avenida, preparando-a para a passagem das escolas de samba mas para a baiana Nilza, que desfila na Acadêmicos do

Tatuapé, atual campeã do carnaval de São Paulo e na Leandro de Itaquera que

permaneceu no grupo de acesso, Deus é

quem está lá abençoando a escola em sua entrada “Deus, ele está aqui. Às vezes o pessoal fala que escola de samba é isso, é aquilo, mas é aqui que Deus está!”.

Onde tudo começou...

Sendo motivo de orgulho, o carnaval se tornou uma das festas mais populares e celebradas no Brasil, tornando-se um elemento cultural nacional. 

Ainda com origem europeia, a festa é comemorada com o jeitinho único brasileiro, com um bom samba e se tornando uma festa acolhedora, com um modo de expressão livre, " Existe um preconceito das pessoas, elas têm preconceito com a escola de samba, mas elas não sabem o que é bom. O importante está aqui, o que eu sinto no coração. Eu mostro agora o que sou, eu sou sambista. Ninguém vai tirar isso de mim” finaliza Nilza. 

Várias formas de comemoração surgiram com o decorrer do surgimento da cultura carnavalesca, no entanto, em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro, a que ganhou força foi o desfile de escolas de samba. Além de um show artístico, é uma bela competição na qual os pontos são dados por juízes. As escolas são julgadas em 10 categorias, sendo elas: bateria, samba enredo, harmonia, evolução, enredo, conjunto, alegorias e adereços, fantasias, comissão de frente e mestre sala e porta bandeira. 

A transmissão do evento é feita ao vivo para vários países, mas nada se compara com a emoção de estar presente na avenida e nos preparativos dessa grande festa. A passista da escola de samba Vai Vai, Jeniffer Ueida ressalta que o carnaval vai muito além de uma competição, o carnaval já faz parte da sua rotina e se tornou uma prioridade, e que é uma festa com um amor sem

tamanho.

O que é pouco notado por quem acompanha o carnaval apenas na avenida ou até mesmo na televisão, é a preparação para que tudo aquilo se torne um grande espetáculo. A organização, desde a escolha do tema e das fantasias, começa aproximadamente 10 meses antes da data marcada do espetáculo, assim que acaba uma edição já se iniciam as preparações para o próximo ano e muitas vezes, com muitas dificuldades, escolas menores não possuem verba suficiente para se tornarem campeãs daquele ano e, novamente, não conseguem uma colocação para se manterem seja no grupo especial, no acesso, em grupos nomeados em grupo 1 à 4 e até nos blocos especiais. Um bom exemplo é a escola Unidos de São Miguel,

escola tradicional do carnaval de São Paulo teve sua melhor colocação no carnaval de 1994, quando se apresentou no grupo especial. Hoje, a escola luta para uma colocação melhor. Com a realização dos seus desfiles no bairro da Vila Matilde, a escola será a última a desfilar, encerrando os desfiles de segunda feira já no amanhecer. Mas sua colocação não impede que a comunidade, que acolhe muito bem a escola, deixe de se orgulhar onde a agremiação já chegou e a luta para um novo record no carnaval paulista. “Me apaixonei e me apaixono por essa escola e toda a comunidade a cada ano que passa. ” Relata Vinicius Pollar, primeiro passista de ouro da agremiação relata com orgulho sua trajetória pela escola e o caminho percorrido até o cargo.

Amor, o casamento com o samba.

“Sou vermelho e branco até o fim!” Júlio Nunes,  da ala da harmonia da escola Leandro de Itaquera conheceu a escola e descobriu seu amor em 2015, quando chegou da cidade de Natal, RN.

Sem nenhum contato com o samba, o jovem de 17 anos foi convidado a participar dos desfiles pela sua madrasta, que já desfila na escola a algum tempo na ala da velha guarda e apresentou os encantos do mundo do samba.

Com sua chegada em São Paulo , a Leandro se tornou sua paixão. Com o sorriso no rosto, Júlio afirma com afinco o que a escola representa em sua vida. ”A Leandro, para mim, significa o amor. É como se a Leandro fosse minha segunda mulher. Se eu fosse casado, seria minha segunda noiva”. Aprendendo os costumes da escola, o sambista explica que em uma escola de samba, a primeira coisa que se deve respeitar é o pavilhão, conhecido popularmente como bandeira, é o símbolo-maior.

Por conseguinte, as baianas e a velha guarda e por último e não menos importante, a harmonia, responsável pelo andamento e evolução durante os desfiles. A paixão pelo festejo fala mais alto do que o

valor disponibilizado para a realização do evento. A presidente da agremiação Leandro de Itaquera, Karin Martins ressalta a dificuldade de superar os desafios quando o assunto é dinheiro “Nós saímos de um carnaval com muitas dívidas e quando sai a verba, a gente já líquida e se inicia outra para que o mesmo possa ir à avenida. É muita criatividade, muita dedicação também para se fazer um carnaval a altura de um especial, mesmo com uma verba de quase 60% a menos. ”.

Tendo outras formas de arrecadação de verba para a realização dos desfiles, já que a verba disponibilizada pela prefeitura não é o suficiente, o passista, Vinicius conta que trazer patrocinadores é uma opção para arrecadar dinheiro e fazer o carnaval, mas não é algo simples, é uma luta diária que as agremiações enfrentam para que possam driblar a falta ou pouca verba. “ O dinheiro disponibilizado pela prefeitura ajuda sim, mas não condiz com a grandeza do trabalho realizado na avenida. Esse é o nosso maior desafio, fazer um desfile com pouco dinheiro, mas que contenha muita história, cultura, beleza e principalmente boas notas em todos os quesitos que adquirimos com muito comprometimento e ensaio. ”

Em busca do título ou da euforia.

Seja no Grupo especial ou nos de acesso ou até mesmo nos blocos,  o que marca a história de uma escola são que os objetivos e títulos alcançados, porém para os amantes da folia o que realmente se leva em consideração é que o desfile seja concluído com sucesso e que todo o esforço realizado na preparação do carnaval tenha saído como planejado, como por exemplo, as fantasias reúnam exatamente o que foi pensado, que os carros alegóricos não tenham problemas durante a apresentação mas o carnaval é muito mais que isso! Não pode faltar principalmente o samba no pé e demonstrar a paixão pela escola no cantar do samba enredo.

A festa do carnaval se propaga no Brasil inteiro, mas só quem sente na pele a passagem da bateria, os foliões exaltando sua escola e a organização e a harmonia sabem que o carnaval vai muito mais além daquilo que passa na tela da televisão. Carnaval é amor. É alegria. É disseminar todo esse sentimento em 60 minutos em uma avenida.  E como diz o samba enredo da escola Leandro de Itaquera, “ Axé pra quem tem fé , e quem não tem, axé para você também”

Fotos Leonardo Macedo e Nathália Peres
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